Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, busca uma mudança completa da ordem global atual e deverá deixar alterações profundas para as instituições de seu país. Nesse processo de mudanças, no entanto, há oportunidades para países como o Brasil, avalia Daron Acemoglu, prêmio Nobel de Economia em 2024.
“O segundo mandato de Trump está claramente caracterizado por uma série de políticas que tem o objetivo claro de revisar toda a ordem global. Trump está tentando mudar alianças globais estruturais, o sistema de comércio e a capacidade dos países trabalharem juntos”, disse, durante uma palestra em um evento da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), realizado em São Paulo. Acemoglu participou por vídeo.
Nascido na Turquia e radicado nos EUA, Acemoglu, 59 anos, é professor do Massachussets Institute of Technology (MIT) e autor de diversos livros, incluindo “Por que as Nações Fracassam”.
Ele apontou que, no cenário externo, as consequências ainda não estão claras. “Ninguém sabe como a ordem do comércio global será, nem como os ativos em dólar vão ficar”, apontou. “O comércio global poderá se tornar algo irreconhecível, com alto custo para países como o Brasil.”
No cenário interno americano, ele viu um cenário com danos à frente. “As instituições ficarão com marcas de Trump, com alta probabilidade, não só pelos próximos dez anos, mas pelos próximos 20 ou talvez 30 anos”, disse
Em sua apresentação, Acemoglu afirmou que o mundo passa por uma série de mudanças profundas ao mesmo tempo. Além das alterações geopolíticas, há ainda o avanço da inteligência artificial, crise climática e alterações demográficas, como o envelhecimento da população.
Para ele, neste cenário, um fator definidor para enfrentar este novo cenário será como os países e setores usarão a tecnologia e como se adaptarão aos novos tempos. “Há oportunidades para os países europeus e o Brasil criarem uma política internacional mais independente e flexível”, afirmou.
Trump como causa e consequência
Acemoglu apontou que Trump, apesar de ser o gerador de várias mudanças, é também consequência de um cenário em que os governos falharam em entregar promessas importantes, como uma melhor distribuição dos ganhos gerados pelo crescimento econômico e bons serviços públicos, como educação, saúde e infraestrutura, além de maior participação política.
“A qualidade e a efetividade dos serviços públicos decaiu nos Estados Unidos, na Europa e em partes da América Latina. Muitas pessoas passaram a sentir que não tinham muita voz e que o processo político tinha se tornado mais tecnocrático e menos responsivo às demandas das pessoas”, afirmou.
Acemoglu aponta que as políticas de Trump, como a de buscar reavivar a indústria americana, não terão sucesso econômico, pois o sucesso econômico hoje é baseado pelas tecnologias digitais de automação, e não mais no trabalho industrial como era feito nos anos 1950.
Perguntado sobre o futuro da agricultura, ele respondeu que o cenário deverá mudar bastante na próxima década. “A tecnologia da agricultura será muito diferente, em termos de energia, sementes e transporte. A força de trabalho é muito jovem, mas trabalhadores jovens estarão em falta nos próximos 90 anos”, disse.
Potencial da IA
Acemoglu disse que pessoalmente não se sentiu muito atraído pela IA, mas que a tecnologia tem grande potencial para trazer mudanças se for usada de modo a ampliar a produtividade dos trabalhadores e facilitar o acesso das pessoas ao conhecimento.
“A IA tem grande potencial para gerar prosperidade compartilhada se for usada não apenas para cortar custos, mas para oferecer novos produtos e serviços”, disse.
Fonte: Exame