O dia 2 de abril foi, até agora, um dos mais importantes para a economia global neste ano. Naquela data, o presidente Donald Trump pegou um cartaz com uma tabela em mãos e passou a anunciar uma série de tarifas. Cada país foi listado com uma taxa que cobraria sobre produtos americanos e, ao lado, qual seria a nova taxa a ser cobrada.
Aquela tarde foi cercada de informações confusas, em um exemplo claro do cenário à frente. Logo se descobriu que a conta feita para chegar às novas tarifas era confusa, pois se baseava no déficit comercial dos países com os EUA, e não nas tarifas cobradas por eles. Além disso, ilhas sem habitantes acabaram sendo taxadas de forma elevada, assim como países muito pobres. Ao mesmo tempo, o tom de ameaça era claro: quem retaliasse os EUA, seria punido.
As tarifas contra a China foram as mais altas: inicialmente, fixadas em 34%. Quando Pequim retaliou, elas foram aumentadas, até chegar a 145%. A escalada entre as duas maiores potências globais alarmou o mercado. As bolsas americanas tiveram quedas históricas e até o valor dos títulos da dívida americana ficou em xeque. Diante das pressões, Trump recuou e adiou as tarifas extras para todos os países, exceto a China, até julho.
Incertezas no ar
O vaivém das tarifas, que ocorreu também em outros casos, como as taxas sobre automóveis, ampliou o clima de incerteza e levou muitos empresários a rever planos e adiar investimentos.
“Estamos em um momento de muita incerteza. As pessoas não estão gastando porque estão com medo do que vai acontecer. Ando conversando com várias pessoas e CEOs de fábricas gigantes. Muitas estão segurando os contêineres na China. Não se sabe qual será o imposto exato que ele [Trump] vai colocar na China”, disse Richard Harary, CEO da MacroBaby, loja de produtos de bebê que atua na Flórida e importa centenas de tipos de produtos.
Para o Fundo Monetário Internacional (FMI), as tarifas impostas por Trump vão frear o crescimento. No começo de abril, a entidade baixou a perspectiva de expansão do PIB global de 3,3% para 2,8%. Nos EUA, a previsão foi rebaixada de 2,7% para 1,8%. No Brasil, de 2,2% para 2%.
“As tarifas representam um choque negativo de oferta para a economia, uma vez que os recursos são realocados para a produção de bens não competitivos, resultando em perda de produtividade agregada, menor atividade econômica e maiores custos e preços de produção”, disse Pierre-Olivier Gourinchas, economista-chefe do FMI, no lançamento do estudo.
“Além disso, no médio prazo, ao reduzir a concorrência, as tarifas aumentam o poder de mercado dos produtores domésticos e diminuem os incentivos à inovação”, afirma. Ou seja: há grande risco de aumento da inflação, especialmente para os consumidores americanos.
Poder de barganha
Apesar das críticas globais, Trump segue defendendo as tarifas, por as considerar uma forma de compensar injustiças que, na visão dele, foram cometidas contra os Estados Unidos por outros países. Ele considera que as tarifas vão gerar mais empregos para os americanos e ainda ajudar o país a arrecadar mais impostos.
Ao mesmo tempo, as taxas são usadas como forma de negociação, para forçar outros governos a fazerem concessões, como baixar tarifas para produtos americanos e rever barreiras comerciais, como cotas de importação. O Brasil, por exemplo, negocia com o governo Trump para tentar se livrar da cobrança geral de 10% sobre seus produtos.
Ao mesmo tempo, enquanto tentam lidar com o cenário incerto nos EUA, os demais países buscam novos parcerias comerciais que não envolvam os americanos. Nesta semana, a China disse que poderá substituir produtos agrícolas comprados dos EUA por itens vindos de outros mercados, em uma medida que deverá beneficiar o Brasil.
“No momento em que o governo chinês retalia os Estados os americanos, em áreas como sorgo, milho, soja, carne bovina, suína, de frango, talvez o único país do mundo que tenha a capacidade tanto em termos de velocidade, quanto que temos em escala de fornecer um substituto quase que automático, é o Brasil”, diz Marcos Troyjo, ex-presidente do New Development Bank (NDB), o banco dos Brics.
Troyjo aponta ainda que as medidas de Trump deverão afetar especialmente as multinacionais americanas, que terão gastos ao mudar suas fábricas de lugar para tentar fugir das novas taxas.
“Nenhum país tem tantas empresas multinacionais como os Estados Unidos, e uma parte importante do investimento americano externo em anos recentes vai passar por um processo de depreciação. Quando isso é acrescido pela necessidade de remontar parques fabris em outras partes do mundo, isso vai exigir um novo esforço de caixa que vai mais uma vez machucar o desempenho dos índices dos mercados de ações nos Estados Unidos”, afirma Troyjo.
Como ocorreu em diversas vezes desde a posse de Trump, o cenário das tarifas ainda deverá ter várias mudanças. Nesta semana, uma das principais notícias é uma nova revisão às tarifas cobradas do setor automotivo, que deverá ser anunciada em um evento para celebrar, simbolicamente, os 100 primeiros dias de governo.
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