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Israel fala abertamente em mudança de regime no Irã, mesmo com pós-Khamenei incerto

Israel fala abertamente em mudança de regime no Irã, mesmo com pós-Khamenei incerto

Embora o governo israelense afirme que a derrubada do regime no Irã não integra os objetivos da ofensiva militar lançada na semana passada, suas lideranças — incluindo o premier, Benjamin Netanyahu — falam cada vez mais, e mais abertamente, sobre a queda do governo que comanda o país desde 1979. A ideia pode soar atraente para muitos em Israel (e nos EUA), mas não há qualquer garantia de que os sucessores do aiatolá Ali Khamenei serão simpáticos a Netanyahu ou a Donald Trump. Pelo contrário.

Há décadas o governo israelense, especialmente Netanyahu, aponta o regime dos aiatolás como uma ameaça existencial, citando declarações defendendo “a aniquilação” de Israel, como o fez Khamenei, além da criação de uma rede de alianças regionais conhecida como “Eixo da Resistência”, formada por outros algozes de Israel.

Com a guerra, um desejo antigo do premier, foram desferidos golpes cruciais ao regime, incluindo a eliminação de parte do comando militar, ataques contra instalações do Exército e da Guarda Revolucionária, e contra locais ligados ao programa nuclear, acusado de ter como objetivo a construção de uma bomba atômica, o que Teerã nega. Mais de 220 pessoas morreram, centenas ficaram feridas e milhares estão deixando a capital iraniana, a qual o ministro da Defesa de Israel, Israel Katz disse que “queimaria”. Na rede Truth Social, Trump disse que “todos deveriam evacuar” a megalópole onde vivem 14 milhões de pessoas na região metropolitana.

Khamenei passou a ser considerado um “alvo legítimo”. Em entrevista à rede ABC, Netanyahu disse que a morte do líder supremo, de 86 anos, “não escalaria o conflito, encerraria o conflito”, e Trump, em sua rede social, disse saber onde está Khamenei, completando que “não vamos matá-lo, pelo menos não por enquanto” e exigindo “rendição incondicional” de Teerã. Segundo o portal Axios, o presidente americano rejeitou um plano israelense para assassinar o aiatolá.

Na terça-feira, Katz afirmou, em comunicado, que se Khamenei não parar de lançar mísseis contra cidades israelenses, poderia ter o mesmo destino de Saddam Hussein, ditador do Iraque deposto pelos EUA em 2003 e executado em 2006.

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Saddam liderou um regime brutal, que massacrou o próprio povo e que lançou uma das guerras mais violentas do final do século XX contra os iranianos, deixando cerca de um milhão de mortos. Mas seu legado mais sensível foi o caos que sucedeu a queda, jogando o país em uma guerra civil, abrindo caminho para o surgimento de grupos terroristas, como o Estado Islâmico, e para o fortalecimento de milícias pró-Teerã.

Ao contrário do regime personalista de Saddam, o sistema criado por Ruhollah Khomeini é complexo e multifacetado. Como apontou Sanam Vakil, diretora do programa para Oriente Médio e Norte da África no centro de estudos Chatham House, em entrevista ao jornal Guardian, a morte de Khamenei “seria um duro golpe”, mas “o regime rapidamente se reuniria e decidiria o que fazer”. A portas fechadas, as lideranças já discutem o processo de transição há anos, e teoricamente já existe um plano para quando o aiatolá morrer, seja por causas naturais, seja em um ataque israelense.

Um risco para Israel é a chegada ao poder de lideranças ainda mais hostis. Andrew Thomas, professor de Estudos do Oriente Médio na Universidade Deakin, acredita que a Guarda Revolucionária poderá se fortalecer caso o aiatolá seja assassinado, abrindo espaço para vozes que apostam na militarização do Estado. Segundo a rede Iran International, ligada à oposição, Khamenei já delegou parte de seus poderes à Guarda.

Talvez por isso, a maior aposta pública de Netanyahu seja em um levante popular contra um regime que, como o chanceler alemão, Friedrich Merz, disse nesta terça-feira, “foi debilitado consideravelmente, e é pouco provável que recupere sua força prévia”. Nos últimos anos, o premier israelense apoiou publicamente protestos contra o governo, como os atos centrados na alta do preço dos combustíveis, na década passada, e no movimento contra a política de repressão contra as mulheres, em 2022 e 2023.

“A decisão de agir, de se levantar desta vez, é a decisão do povo iraniano”, disse no domingo, em entrevista à Fox News.

‘Não destruam minha cidade’

O regime dos aiatolás é rejeitado por boa parte da população (assim como o alinhamento a Israel), como apontam sondagens independentes, que reclama da economia em pedaços, do isolamento internacional e da supressão de direitos, com perseguições, prisões, tortura e execuções de quem se desvia “da linha do imã”. Mas as bombas são uma ameaça mais imediata.

“A maioria dos iranianos, mesmo aqueles que se opõem ao governo, agora percebeu que a liberdade e os direitos humanos não vêm de bombas israelenses caindo sobre cidades onde vivem civis indefesos”, disse à rede BBC uma moradora de Teerã que foi a protestos contra o regime, mas que chamou a guerra lançada por Israel de “indesculpável”.

A vencedora do Nobel da Paz, Narges Mohammadi, aprisionada pelo regime e torturada na prisão, lembrou, em publicação no Instagram, das milhões de pessoas que vivem em Teerã, com “vendedores ambulantes, mulheres que são as únicas provedoras de suas famílias, jornalistas, cafés, parques e centros de diversão”, e questionou:

“Qual deles devemos carregar em nossos ombros para salvar da morte e da devastação? Não destruam minha cidade. Acabem com esta guerra.”

A oposição no exterior, embora tenha dinheiro e influência entre políticos e veículos de imprensa ocidental, parece ter pouco poder para derrubar a República Islâmica.

O filho do último xá do Irã, Reza Pahlevi, vive nos EUA e defendeu os bombardeios contra o que chamou de “liderança corrupta e incompetente”, além de pedir às lideranças militares, hoje preocupadas com a guerra, que “rompam os laços com os aiatolás”, mas seu alinhamento com Israel é criticado internamente. O grupo Mujahedin do Povo, baseado na França e na Albânia, e que tem alguns nomes conhecidos em sua lista de pagamentos, como o ex-prefeito de Nova York e aliado de Trump, Rudolph Giuliani, aposta no caos para voltar ao país. Contudo, sua aliança com o regime de Saddam Hussein na guerra dos anos 1980 tornou a organização intragável para muitos.

Uma alternativa para os israelenses causarem danos ao regime é usar movimentos étnicos como forma de desestabilização. Os curdos, cerca de 10% da população, têm um longo histórico de coordenação com os EUA e com Israel, e ao menos um dos grupos no Irã, o Partido da Liberdade Curda (PAK), propôs “uma revolta nacional para acabar com o regime ou reduzi-lo em Teerã” após o início dos bombardeios. Para especialistas, outras minorias não têm o mesmo interesse na derrubada do regime, como os azeris e os armênios, ou não têm poder de fogo para tal, como a resistência no Baluquistão, perto da fronteira paquistanesa.

Mas como mostra a História, tempos de guerra não necessariamente levam a revoltas internas. Quando o Iraque invadiu o Irã, nos anos 1980, Saddam Hussein esperava que a minoria árabe no Khuzistão lhe receberia de braços abertos, mas o ataque acelerou o apoio local à República Islâmica — Khomeini cometeu erro semelhante em Basra, pouco depois. Com as bombas e centenas de mortes de civis, um levante encontra pouco apelo junto à população, seja da maioria persa, seja das minorias étnicas. Ao menos neste momento.

“O povo iraniano tem uma característica importante: eles se unem quando há agressão estrangeira contra sua terra natal. Até mesmo opositores sérios do governo da República Islâmica estão agora ao lado deste governo para repelir a agressão de Israel contra sua terra”, disse à revista Newsweek Alireza Taghavinia, analista político baseado em Teerã. “Os iranianos têm um forte senso de nacionalismo.”

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Fonte: InfoMoney

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