Em meio à sequência de máximas recentes do Ibovespa, que na segunda-feira (19) bateu mais um recorde nominal, chegando a superar, durante o pregão, o patamar inédito de 140 mil pontos, o capital estrangeiro tem ganhado protagonismo e pode se tornar um importante vetor de sustentação para o mercado acionário brasileiro. A avaliação é compartilhada por analistas do Santander e do Itaú BBA, que vêm observando uma postura mais otimista dos investidores internacionais em relação ao Brasil, à medida que fatores domésticos e externos reforçam o interesse por ativos locais.
Segundo o Santander, o fluxo estrangeiro para ações brasileiras permaneceu positivo por 17 pregões consecutivos até a semana passada, somando R$ 20 bilhões em entradas desde 17 de abril. Parte dessa movimentação, dizem os analistas, é atribuída à percepção de que o Banco Central brasileiro está próximo de encerrar o ciclo de cortes na taxa básica de juros. Para muitos gestores globais, a pausa do Copom representa um momento de maior previsibilidade, o que facilita a tomada de decisão sobre exposição a ativos de risco no país.
Esse movimento também pode ser notado no mercado de Fundos de Índices (ETFs), com aumento expressivo na criação de cotas do EWZ — fundo negociado em Nova York que replica o desempenho do mercado acionário brasileiro. O índice de momentum calculado pelo banco atribui atualmente nota 7 de 10 às ações locais, sugerindo que, na ausência de mudanças abruptas, a tendência de valorização pode prosseguir.
O Santander aponta que há espaço relevante para um deslocamento maior de capital global em direção ao Brasil, sobretudo diante da diversificação de portfólios fora dos Estados Unidos. A instituição projeta que, em uma hipótese conservadora de realocação de um ponto percentual do total de ações americanas detidas por estrangeiros, o Brasil poderia captar até US$ 26,5 bilhões (aproximadamente R$ 150 bilhões). Em um cenário mais agressivo, esse volume saltaria para US$ 74 bilhões (R$ 422 bilhões), montante próximo de um quinto do valor de mercado do índice IBrX-100.
Já o Itaú BBA reforça essa percepção a partir da 18ª Conferência de CEOs da América Latina, realizada em Nova York neste mês. O evento reuniu 143 empresas e mais de 500 investidores globais em mais de 1.300 reuniões, revelando um tom favorável à América Latina como um todo, e ao Brasil, em particular. De acordo com o banco, o país passou a ocupar uma posição overweight (acima da média) nas carteiras de estrangeiros, o que representa uma forte mudança em relação ao movimento de retirada de recursos registrado em 2023.
Os dados mostram que os investidores estrangeiros foram responsáveis por entradas líquidas de R$ 20,6 bilhões no mercado brasileiro em 2024 até meados de maio, revertendo a saída de R$ 33 bilhões no mesmo período do ano passado. Além dos tradicionais fundos emergentes, o Brasil voltou ao radar de fundos globais mais amplos, reforçando o interesse pela Bolsa local.
As taxas de juros seguem no centro das atenções, conforme os analistas. Tanto investidores locais quanto estrangeiros ouvidos pelo BBA apontam a política monetária como o fator mais relevante para a tomada de decisão. Uma pesquisa com gestores conduzida pelo banco mostrou que 49% acreditam que o nível atual da taxa Selic, em 14,75%, é o principal motor do mercado nos próximos seis meses, seguido pelas discussões sobre o equilíbrio fiscal, com 39%.
Mesmo diante de algumas incertezas locais, como a trajetória das contas públicas, o banco diz que o ambiente atual tem favorecido a reavaliação do Brasil por parte de grandes investidores. A América Latina, de forma geral, opera com múltiplos inferiores à média histórica — no caso do Brasil, o índice preço/lucro (P/L) está 20% abaixo da média —, o que pode funcionar como argumento adicional para alocação de capital.
Com a saída de recursos dos Estados Unidos em busca de oportunidades fora dos centros tradicionais e a melhora na percepção de risco de países latino-americanos, analistas avaliam que há margem para que o fluxo estrangeiro continue dando tração à Bolsa brasileira nos próximos meses. A convergência de fatores técnicos, como valuation atrativo, e fatores macroeconômicos, como o fim do ciclo de cortes de juros, forma um ambiente em que o apetite por risco volta a se manifestar de forma mais clara.
Empresas que estão no radar dos investidores
O fluxo estrangeiro recente também vem moldando o perfil da demanda por ações. O setor financeiro é o mais procurado por estrangeiros, com compras líquidas de cerca de R$ 6 bilhões no ano. Empresas como Itaú (ITUB4), BTG Pactual (BPAC11) e Sabesp, segundo o BBA, figuram entre os nomes mais requisitados. A estatal de saneamento paulista, aliás, chamou a atenção tanto de estrangeiros quanto de investidores locais — o que coincide com o aumento do interesse internacional por ativos ligados a infraestrutura.
Outros setores que vêm ganhando espaço nas carteiras de investidores internacionais incluem consumo, saúde e industrial. Ações como Rede D’Or, Hapvida (HAPV3), C&A e Localiza estão entre as mais procuradas nas reuniões com analistas do banco. A expectativa é de que esses setores se beneficiem de um eventual ciclo sincronizado de corte de juros na América Latina, previsto para os próximos 12 meses, o que pode favorecer a retomada do crescimento dos lucros das companhias da região em até 15% na comparação com 2024.
A C&A (CEAB3) apresentou sinais claros de aceleração nas vendas, beneficiada por uma melhora no clima e bases comparativas mais fracas. A varejista projeta crescimento de vendas nas mesmas lojas (SSS) acima de 20% no segundo trimestre, superando os 15% registrados no primeiro. Apesar dos desafios cambiais, a empresa acredita que os aumentos de preços recentes sustentam a margem bruta, sinalizando resiliência no atual cenário macroeconômico.
Já a Direcional (DIRR3), focada no segmento de baixa renda, se beneficia da revisão do programa Minha Casa Minha Vida. A empresa mantém margens estáveis e adotou discurso otimista em relação a dividendos, com expectativa de até R$ 1 bilhão no ano.
A Localiza (RENT3) foi a empresa mais procurada da conferência, com destaque para divergências de percepção entre investidores locais e estrangeiros. Enquanto os primeiros demonstraram cautela diante da possibilidade de queda nos preços de seminovos, os estrangeiros se mostraram otimistas com o aumento nas tarifas e a melhora no ROIC Spread, diante da estabilização dos juros.
A PRIO (PRIO3), por outro lado, consolidou sua posição como uma das favoritas do setor de óleo e gás. A aquisição de Peregrino foi altamente rentável e aumenta a estabilidade operacional da companhia, que pode atingir produção diária de 200 mil barris. A expectativa é de rápida desalavancagem até 2026, mesmo com petróleo a US$ 60.
A Rede D’Or (RDOR3) apresentou avanços operacionais importantes, especialmente na Atlântica D’Or, sua joint venture com a Bradesco Saúde. A empresa destacou que os novos hospitais já operam com eficiência próxima ao portfólio principal e que o cluster deve impactar positivamente as margens a partir do segundo semestre de 2025. No braço de seguros, os ajustes em produtos e o controle de custos reforçam a estratégia de expansão sustentável.
Por fim, a Sabesp (SBSP3) atraiu forte interesse dos investidores estrangeiros, que veem com bons olhos o processo de turnaround e o cumprimento das metas de universalização. A ampliação do número de empreiteiras e o avanço no reequilíbrio tarifário são pontos destacados como diferenciais na execução do plano de investimentos.
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Fonte: InfoMoney