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Governo deve limitar taxa de desconto de VR e VA, e cortar prazo para lojista receber valor da venda

O governo deve reduzir de 30 dias para dois dias o prazo para que os supermercados, bares e restaurantes recebam os valores das vendas feitas por meio do vale-refeição (VR) e vale-alimentação (VA), afirmaram à EXAME técnicos que participam das discussões.

Além disso, o Executivo deve limitar a taxa de desconto — conhecida no mercado como MDR (Merchant Discount Rate) — cobrada dos estabelecimentos comerciais.

Quando um supermercado, um bar ou um restaurante faz uma venda no cartão, ele sofre uma taxa de desconto sobre o valor recebido. Essa taxa serve para remunerar os três elos da cadeia de cartões: a maquininha, o banco emissor do cartão e a bandeira (Mastercard, Visa e Elo são as maiores do país). A empresa de maquininhas é responsável por recolher a taxa e repassá-la aos demais.

No caso do setor de benefícios, as empresas tradicionais, como Alelo, Sodexo, Ticket e VR, atuam no mercado por meio de um arranjo fechado de pagamento e definem o próprio MDR.

Cada empresa tem liberdade para definir sua taxa de desconto e esses dados não são públicos. Com isso, as empresas de arranjos fechados são a bandeira e o emissor do cartão. A empresa de maquininha é apenas um instrumento tecnológico em que as vendas são processadas e é remunerada para isso.

A ideia em estudo pelo governo é limitar essa taxa de desconto. O percentual não está definido, mas pode variar entre 3% a 4%, segundo interlocutores que participam da discussão. Não existem dados públicos sobre o percentual médio do MDR cobrado no Brasil pelas empresas de benefícios.

Quem acompanha o mercado afirma que esse valor pode ultrapassar os 5%. A Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT) afirma que a taxa entre os associados varia entre 3,5% e 4,5%. No caso do cartão de crédito, a taxa média de desconto era de 2,27% no quarto trimestre de 2024, segundo dados do Banco Central (BC). No mesmo período, no débito, o percentual era de 1,09%.

As empresas de arranjos fechados afirmam que têm custos superiores diante da necessidade de credenciar os estabelecimentos e da necessidade de fiscalizar se bares, restaurantes e supermercados cumprem as regras determinadas pelo Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). A venda de bebidas alcoólicas, por exemplo, é proibida por meio de VR e VA e, caso isso ocorra, o lojista pode ser descredenciado. Segundo a Associação Brasileira de

Além das empresas de arranjos fechados, atuam no mercado de VR e VA companhias de arranjos abertos, como Caju, Flash e Swile. Nesse caso, essas empresas são apenas emissores do cartão e se organizam por meio do mercado tradicional de pagamentos em que há uma bandeira, um emissor e uma maquininha de cartão. Dessa forma, não são as empresas de arranjo aberto que definem o MDR.

Redução do prazo de pagamento de lojistas

Segundo executivos de mercado, mais da metade do volume de benefícios de vale-refeição e alimentação são contratados pelo setor público. E os órgãos municipais, estaduais e federais, por decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), têm garantia contratual de pagar as empresas de benefícios 30 dias após o crédito dos valores nos vale-refeições e vale-alimentações dos trabalhadores.

Na prática, a redução do prazo para repasse dos pagamentos aos lojistas afetaria significativamente o fluxo de caixa das empresas de benefícios. Alguns deles alertaram que a mudança desse prazo pode quebrar várias empresas. Com isso, se o governo optar pelas mudanças, avaliam executivos do setor, seria necessário um cronograma com prazos para garantir a saúde financeira das empresas.

Crise do preço dos alimentos abalou o setor

As duas propostas devem ser formalizadas em um decreto do Ministério do Trabalho e Emprego e podem ser anunciadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em pronunciamento à nação, em rede nacional de televisão, em 1º de maio. Tradicionalmente, Lula se manifesta aos trabalhadores nesta data.

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Esse anúncio seria uma resposta do governo à crise do preço dos alimentos que chegou ao governo em janeiro de 2025.

O setor de VR e VA foi dragado esse imbróglio após a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) alegar, em reunião com o presidente Lula e ministros, que as empresas de benefícios cobram taxas dos lojistas que podem chegar a 15%, quando consideradas transações, taxas de administração, adesão e antecipação de recebíveis.

Segundo a Abras, essas taxas são repassadas aos preços dos alimentos, o que encarece o preço do produto final.

A proposta apresentada pela entidade prevê que o PAT seja operado diretamente pelo governo, eliminando as empresas de benefícios, via pagamento do valor do benefício em conta salário.

Segundo a entidade, esse modelo, sem um intermediário, representaria uma economia em taxas para os supermercados de R$ 10 bilhões por ano, “que poderiam ser revertidos para redução do custo da alimentação”.

Divisão no governo

Esse debate gerou uma divisão no governo. De um lado, o Ministério do Trabalho é contra o pagamento do benefício direto na conta do trabalhador.

Segundo técnicos da pasta, essa proposta acaba com o PAT e desvirtua um programa exitoso. Do outro lado, o Ministério da Fazenda tem sinalizado disposição em encontrar uma solução e tem visto com bons olhos a possibilidade de o governo repassar o dinheiro diretamente ao trabalhador.

Entretanto, técnicos da pasta sabem que essa medida dependerá de uma alteração na lei do programa, o que exige aprovação do Congresso.

Além disso, a Fazenda defende que o Banco Central (BC) passe a ter ingerência nesse mercado. A autoridade monetária, por fim, não quer a obrigação. Na última quinta-feira, 24, o diretor de Organização do Sistema Financeiro e Resolução do BC, Renato Gomes, disse nesta quinta-feira que os arranjos vinculados ao PAT não são sistemicamente importantes e, portanto, não devem ser regulados pela autoridade monetária.

“Seja no aspecto sistêmico, seja no aspecto de pagamentos, nós entendemos que são assuntos que não deveriam ser tratados pelo Banco Central”, disse Gomes, durante entrevista coletiva para comentar as prioridades regulatórias do BC para o biênio 2025-2026.

O auxílio-alimentação pago aos trabalhadores por meio dos cartões de VR e VA faz parte do PAT, criado pelo governo em 1976. Toda regulamentação desse programa é feita pelo Ministério do Trabalho e Emprego e não compete ao BC.

Segundo a autoridade monetária, alguns tipos de arranjo de pagamentos não estão sujeitos à regulação do BC, tais como os cartões private label – emitidos por grandes varejistas e que só podem ser usados no estabelecimento que o emitiu ou em redes conveniadas.

“Também não são sujeitos à supervisão do BC os arranjos para pagamento de serviços públicos (como provisão de água, energia elétrica e gás) ou carregamento de cartões pré-pagos de bilhete de transporte. Incluem-se nessa categoria, ainda, os cartões de vale-refeição e vale-alimentação”, informa o BC, no próprio site.

Entidades são contra propostas

A ABBT afirmou que “propostas absurdas e sem fundamentos” para a reformulação do PAT têm sido insistentemente divulgadas, como o pagamento em dinheiro dos vale alimentação e refeição.

“Isso traz o risco de o benefício ser usado para o consumo de bebidas alcoólicas, cigarros, pagamento de dívidas e até em apostas e jogos de azar, por exemplo. E o resultado será um trabalhador com menos dinheiro para comprar sua alimentação, desnutrido e mais suscetível a doenças”, informa a entidade em seu site.

Em nota, a Câmara Brasileira de Benefícios ao Trabalhador (CBBT) informou que diante da discussão sobre possíveis alterações no PAT, entende que não há estudo que comprove que as mudanças propostas reduziriam os preços dos alimentos para os trabalhadores, além de poderem impactar negativamente na concorrência.

“Também, avalia que tais intervenções não garantem menores taxas e maior competição, e que há mecanismos mais eficientes e eficazes para tais fins já previstos na Lei 14.442/22. A referida lei direciona a discussão e implementação da interoperabilidade em seus próprios termos. Acreditamos que a regulação do PAT já contém os mecanismos necessários para coibir taxas excessivas, que podem impactar o preço final dos alimentos”, afirmou a entidade.

A CBBT defendeu que o governo regulamente a interoperabilidade, inspirada no modelo do mercado de adquirência. Segundo a entidade, essa proposta traria ganhos reais de concorrência, melhoraria a oferta de produtos e serviços e, consequentemente, reduziria as taxas praticadas atualmente.

“Reconhecemos e apoiamos os esforços do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e do Ministério da Fazenda na análise desses temas importantes. Contudo, reforçamos que qualquer mudança demanda análise cuidadosa e fundamentada, como prevê a lei, e deve ser debatida amplamente por meio de consultas públicas. Isso é crucial para evitar impactos negativos em uma política tão relevante para milhões de trabalhadores brasileiros”, informou a entidade.

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