Uma dor de cabeça do tamanho das megaproduções de Hollywood: é o que se tornou o histórico conglomerado de mídia WarnerBros para seus últimos donos.
Na verdade, WarnerBros Discovery. Uma correção oportuna para começar esta história.
Há uma semana, o grupo formado pela fusão entre Discovery e WarnerMedia em 2022 anunciou uma… cisão. A ruptura prevista para meados de 2026 dá origem a duas empresas: uma composta pelos estúdios de televisão e seriados, bem como o serviço de streaming HBO Max; outra formada pelos canais de televisão linear, como CNN, TNT Sports e Discovery.
Batizada de Global Networks, a companhia composta basicamente por canais de televisão à cabo mantém uma participação de 20% da empresa irmã, chamada de Streaming & Studios, e fica com a maior responsabilidade sobre as dívidas de US$ 34 bilhões do grupo.
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“Essa separação revigorará cada empresa, permitindo que elas aproveitem seus pontos fortes e perfis financeiros específicos”, disse o CFO da WarnerBros Discovery, Gunnar Wiedenfels.
Trocando em miúdos, a empresa dos segmentos Streaming & Studios abrigará os ativos de rápido crescimento, enquanto sua contraparte reunirá canais de televisão cada vez mais acossados pela crescente concorrência dos próprios serviços de streaming nas últimas décadas.
É um resultado muito diferente do que o atual presidente e CEO da Warner Bros Discovery, David Zaslav, poderia imaginar há três anos, quando topou comprar a então WarnerMedia da AT&T em uma negociação envolvendo mais de US$ 40 bilhões em dinheiro mais dívidas.
União instável
Zaslav fez algo aparentemente improvável: à frente de uma rede de canais de médio porte reconhecida por seus reality shows de baixo orçamento, levou na fusão propriedades intelectuais como “Superman”, “Batman”, “Harry Potter” e todo o aclamado catálogo de séries da HBO.
Não era lá um negócio super disputado. Na verdade, a AT&T havia comprado a Times Warner há menos de cinco anos por um valor próximo a US$ 100 milhões. Logo a junção das operações levaria a um choque de culturas empresariais, publicou o New York Times.
No entanto, o problema ia além. Naquela altura, uma antiga empresa de locação de filmes já havia se tornado um problemão para suas concorrentes na indústria de mídia. Entre 2018 e 2019, a Netflix (NFLX34) levava para casa alguns dos hitmakers de Hollywood como Ryan Murphy e Shonda Rhimes por contratos na casa das centenas de milhões — e as emergentes plataformas de streaming disputavam a tapa produções populares para incluir em seus portfólios.
A própria WarnerMedia, em 2019, chegou a pagar US$ 1 bilhão pela exclusividade de cinco anos da HBO Max no streaming da série “The Big Bang Theory”, reportaram veículos especializados à época.
Fazia sentido, para alguns executivos de mídia, que um catálogo interminável de produções fosse a fórmula para frear o avanço da Netflix na “Guerra dos Streamings”. Mas em 2022, a recém-criada WarnerBros Discovery decidiu reformular a marca “HBO Max” para simplesmente “Max”. Afinal, os usuários do streaming poderiam navegar desde produções como “Família Soprano”, “Succession” ou “Game of Thrones” até reality shows do canal Food Network, até então hospedados no Discovery+.
Mais do que isso, eles seriam atraídos pelos títulos da HBO e convencidos a continuar pagando suas mensalidades pela variedade do cardápio combinado com os programas da Discovery.
Mas faltou combinar com a audiência. O público queria mesmo era assistir às sessões de terapia de um mafioso em Nova Jérsei, às extravagantes disputas sucessórias de bilionários do setor de mídia e às violentas batalhas entre as famílias medievais no mundo fantástico de Westeros.
Em maio deste ano, a WarnerBros Discovery voltou atrás no rebranding. Nada de “Max”, o nome é “HBO Max”. “Hoje, estamos trazendo de volta a HBO, a marca que representa a mais alta qualidade em mídia, para acelerar ainda mais esse crescimento nos próximos anos”, disse Zaslav em um evento da companhia.
De volta para o futuro
O retorno às origens teve suas razões: Zaslav não conseguiu alcançar a escala de seus principais concorrentes, Netflix e Disney+ (DISB34), embora os resultados do streaming sob sua gestão tenham melhorado. Também tem se disseminado o sentimento entre empresas de mídia que seus ativos de TV linear se tornaram um “trambolho” gerador de receita de futuro desanimador.
“A cisão destaca uma mudança mais ampla na mídia: os conglomerados estão se
desmantelando à medida que o corte de assinaturas de TV a cabo se acelera.
Fundamentalmente, o modelo puro da Netflix ainda comanda uma relação de preço por lucro futuro [indicador de preços de ações] mais do que o triplo do da WBD”, diz um relatório da Mirabaud reunindo impressões de analistas.
A aposta de alguns analistas é que essa divisão pode atribuir um prêmio semelhante ao da Netflix à nova divisão de crescimento mais rápido nos streamings, aponta a Mirabaud.
Apesar das idas e vindas durante o período de Zaslav à frente da WarnerBros Discovery, a HBO Max (ou Max, dependendo do ano) se tornou novamente lucrativa e adicionou, apenas em 2024, 22 milhões de novos assinantes à sua base.
O EBITDA (sigla em inglês para lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização), importante indicador de resultado operacional saiu de US$ 1,6 bilhão negativo em 2022 para US$ 677 milhões positivo em 2024. No segmento de estúdios, a Warner emendou duas das três maiores bilheterias domésticas dos Estados Unidos em 2025 com “Um Filme Minecraft” e “Pecadores”, após um crescimento de 20% no EBITDA do segmento em 2024.
Setor de streamings
Analistas mais otimistas acreditam que a divisão permitiria que o segmento de Streamings & Studio, de alto crescimento, siga o ritmo de investimentos, enquanto a unidade de canais equaliza as dívidas de mais de US$ 30 bilhões, aponta o relatório da Mirabaud.
Uma estratégia similar foi adotada pela Comcast, controladora da NBCUniversal, ao anunciar em 2024 que abriria mão de cinco canais de televisão cuja receita anual somada era de US$ 7 bilhões anuais.
Outro grupo de especialistas é mais céticos quanto à cisão. Se a empresa do segmento de Streamings & Studio pode levar a um prêmio dos investidores, a unidade Global Networks teria o ônus da dívida e criaria uma espécie de “bad bank“, entidade destinada a controlar ativos problemáticos.
E para manter o ritmo de produções atraentes, a operação de streamings e estúdios precisaria continuar lidando com margens comprimidas de fluxo de caixa. Em 2023, o valor disponível para investimentos na WarnerBros Discovery foi de US$ 6 bilhões, e caiu para US$ 4,4 bilhões em 2024.
Desde o anúncio sobre a divisão, as ações da WarnerBros Discovery valorizaram cerca de 12%. É um crescimento que não chega nem perto de compensar a queda de 60% anotada pelos papéis desde a fusão entre WarnerMedia e Discovery, em 2022.
Nesta segunda-feira (16), a gigante da mídia afirmou que um número suficiente de credores apoiou o plano de divisão dos negócios. Pela proposta, a empresa reunindo HBO Max e estúdios teria David Zaslav como CEO. O CFO Gunnar Wiedenfels ocuparia a cadeira de presidente no segmento de mídia.
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Fonte: InfoMoney