Desde que desembarcou no Brasil, Carlo Ancelotti virou estrela de um reality show não oficial encabeçado pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Vídeos e fotos do treinador italiano se multiplicaram nas redes da entidade: Ancelotti chegando ao aeroporto, conhecendo o Rio de Janeiro, sendo recepcionado na sede da CBF, visitando o Cristo Redentor, conhecendo os estádios do país e pisando na Granja Comary.
A cobertura intensa e quase diária transformou o técnico em protagonista de uma campanha midiática planejada para além das quatro linhas e que pode fazer a entidade recuperar a sua imagem desgastada, conforme mostraram especialistas ouvidos pelo Infomoney.
A estratégia surtiu efeito imediato. Apenas após sua apresentação oficial como novo técnico da Seleção Brasileira, em 26 de maio, Ancelotti ganhou quase 200 mil novos seguidores, elevando seu total a impressionantes 1,1 milhão de novos fãs em apenas uma semana. A média diária de crescimento do seu perfil, que era de cerca de 2 mil, explodiu com a chegada ao comando da Seleção.
Quem também surfou na onda foi a própria CBF. Após meses em queda de reputação, marcados por escândalos políticos, crises internas e descontentamento generalizado da torcida, a entidade viu seu perfil no Instagram voltar a crescer.
Na mesma semana da chegada de Ancelotti, a conta bateu 18 milhões de seguidores, com 200 mil novos fãs somente após a apresentação do treinador. O vídeo postado no Instagram pessoal do italiano, com o título “Olá, Brasil!”, uma saudação simples acompanhada de imagens de ídolos da Seleção, acumulou quase 9 milhões de visualizações. Já os vídeos da CBF sobre bastidores, treinos e aparições do técnico somaram impressionantes 43,6 milhões de views.
A explicação para essa força vai além do carisma de Ancelotti. Como lembra Renê Salviano, CEO da Heatmap e especialista em marketing esportivo, “estamos falando de um dos técnicos mais vencedores da história do futebol”. Campeão por Milan, Real Madrid, PSG, Chelsea, Bayern de Munique e Juventus, Ancelotti não é apenas um treinador, é uma marca global.
Seu alcance nas redes comprova: são mais de 12 milhões de seguidores, número que supera o de nomes como Guardiola (8,5 milhões), Mourinho (5,5 mi), Klopp (4,6 mi), e até do campeão do mundo Lionel Scaloni (2,3 mi).
Para Bruno Brum, CMO da Agência End to End, a presença digital de Ancelotti se tornou um ativo estratégico para a CBF: “Em um cenário onde engajamento se traduz em valor de marca, audiência e novas receitas, contar com um técnico que tem mais seguidores do que toda a elite do futebol brasileiro somada é um diferencial raro”. Brum também destaca que, mesmo com um perfil discreto, o técnico italiano construiu uma imagem sólida, autêntica e altamente conectada às grandes torcidas globais.
Por trás da celebração digital, há uma tentativa clara de reverter uma crise mais profunda. A CBF ainda lida com os escombros da saída conturbada do ex-presidente Ednaldo Rodrigues, com investigações, acusações e desconfiança institucional. A imagem da entidade, associada por muitos torcedores a corrupção, amadorismo e falta de transparência, está longe de ser resgatada apenas com boas postagens.
“A instituição vive uma crise de imagem e credibilidade que não se resolve com marketing de curto prazo”, afirma Eduardo Carlassara, Doutor em Marketing Esportivo e CEO da Agência Develop.
Para ele, o uso de Ancelotti pela CBF é uma estratégia clássica de “transferência de imagem”: ao associar-se a uma figura de prestígio, a entidade tenta absorver valores como excelência, responsabilidade e competência, justamente os que perdeu nos últimos anos.
“Essa estratégia consiste em fazer com que todos os elementos associados à marca Ancelotti sejam naturalmente transferidos para a CBF, a partir da percepção do torcedor de que agora ambas as marcas se complementam e estão juntas. Quando falamos de um técnico com o currículo, histórico e conquistas de Carlo Ancelotti, associam-se a ele atributos como credibilidade, responsabilidade, comprometimento e excelência, justamente os que a CBF mais perdeu nos últimos anos”, completou Carlassara.
Mas o especialista alerta: “Isso só funciona se for sustentado por mudanças estruturais. Caso contrário, a esperança depositada em Ancelotti se esvairá e restará a pergunta: ‘Se nem ele resolveu, quem resolverá?”.
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Fonte: InfoMoney