Três dos destinos mais procurados por brasileiros que desejam viver no exterior acabam de impor restrições para estrangeiros em diferentes âmbitos. Argentina, Portugal e Itália implementaram ou anunciaram mudanças drásticas em suas políticas migratórias e de cidadania, afetando diretamente milhares de brasileiros que já vivem nesses países ou planejam se mudar.
O presidente da Argentina, Javier Milei, anunciou uma reforma migratória que endurece as regras para entrada, permanência e acesso a serviços públicos por estrangeiros. A partir da publicação do decreto – previsto para os próximos dias – estrangeiros condenados por qualquer crime poderão ser deportados, mesmo que a pena seja leve. Além disso, a entrada de pessoas com antecedentes criminais passa a ser proibida. E são outros pontos da reforma:
Estrangeiros (incluindo turistas) deverão contratar seguro de saúde obrigatório;
Em universidades públicas, estudantes sem residência permanente poderão ter que pagar mensalidades – a mudança afeta diretamente os mais de 100 mil brasileiros que vivem no país.
O governo também endureceu as regras para a obtenção da residência permanente e da cidadania. Será necessário comprovar renda estável, não ter antecedentes criminais e, no caso da cidadania, ter vivido pelo menos dois anos seguidos no país e realizado um investimento relevante.
Deportação
Já o governo português notificará 18 mil imigrantes que tiveram seus pedidos de residência negados, pedindo que deixem o país. O prazo para saída voluntária é de 20 dias, sob pena de deportação forçada. A decisão, que ocorre em meio a uma crise política, atinge sobretudo cidadãos da Ásia, segundo dados oficiais.
Brasileiros, que formam a maior comunidade estrangeira em Portugal, seriam uma minoria entre os afetados – embora o número exato ainda esteja sendo apurado pelo Itamaraty e pela Embaixada do Brasil em Lisboa.
Os casos mais comuns de indeferimento envolvem a ausência de documentação, processos anteriores negados em outros países da União Europeia ou antecedentes criminais. A medida preocupa brasileiros que ainda aguardam análise de seus pedidos, num contexto em que Portugal acumula uma fila de mais de 110 mil solicitações de residência.
Para o professor Leonardo Cavalcanti, do Departamento de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Brasília (UnB), imigrantes vêm sendo usados como “bodes expiatórios” por países do Hemisfério Norte. “Houve uma reorganização do emprego, um aumento de desigualdade, e aqueles níveis de bem-estar social vividos na segunda metade do século XX estão cada vez mais frágeis. Ao invés de resolver essas questões estruturais, surgem discursos anti-imigração, como se os imigrantes fossem a causa de todos esses problemas. Em Portugal, não foi diferente”, afirma.
Ele reforça que há uma “limitação teórica e econômica” em acreditar que imigrantes roubam empregos ou destroem estruturas sociais. “Pelo contrário, são pessoas que contribuem para questões demográficas nesses países, que são aceleradas, e criam uma demanda e oferta próprias”, detalha Cavalcanti.
Cidadania italiana
A Itália aprovou uma nova legislação que praticamente extingue a possibilidade de brasileiros obterem a cidadania italiana por descendência além da geração de netos. O chamado jus sanguinis – que garantia a cidadania a descendentes de italianos, independentemente da geração – foi drasticamente limitado. Agora, apenas filhos e netos diretos de pessoas nascidas na Itália podem solicitar a cidadania de forma administrativa.
O impacto é imediato: consulados italianos já deixaram de aceitar novos pedidos, e quem estava na fila – que em alguns casos passava de 10 anos de espera – terá seus processos cancelados. Aqueles que já estão na Itália tentando concluir o processo também podem ser obrigados a retornar ao Brasil.
Há, no entanto, uma exceção: filhos menores de idade de italianos já reconhecidos podem ser incluídos até 31 de maio de 2026. Fora isso, a única alternativa será a via judicial, que envolve custos elevados e longos prazos.
O cenário que antes parecia promissor para muitos brasileiros em busca de qualidade de vida, estudo ou trabalho no exterior, agora exige mais planejamento, recursos financeiros e disposição para enfrentar processos mais burocráticos e rigorosos.
“Os imigrantes contribuem para a economia, são pessoas jovens que já vêm prontas para o trabalho. De um lado, se necessita intensamente dessa mão-de-obra, e, de outro, há discursos anti-imigração”, pondera Leonardo Cavalcanti.
Fonte: Exame