Por Rafaela Tavares Lima e Samuel de Jesus Monteiro de Barros*
Com 3 entre 10 brasileiros considerados analfabetos funcionais, o Brasil segue enfrentando um entrave congênito à produtividade. A experiência de países da OCDE demonstra que o investimento contínuo em educação básica é um dos principais motores do crescimento econômico. No entanto, os indicadores brasileiros revelam uma preocupante estagnação nesse campo — e, com ela, uma limitação crônica do potencial produtivo nacional.
Dados recentes do Indicador de Analfabetismo Funcional (Inaf) revelam que, em 2024, 29% da população brasileira permanecia no nível de analfabetismo funcional — a mesma proporção observada em 2018. Ao mesmo tempo, uma certa paralisia também se encontra na economia: nesse mesmo intervalo, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita do Brasil cresceu apenas 7%, enquanto a Argentina, mesmo diante de instabilidade política e econômica, apresentou crescimento três vezes superior, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI).
As decisões tomadas em políticas educacionais não afetam apenas o desempenho do brasileiro – elas refletem diretamente no resultado econômico do país. O capital humano — medido, entre outros fatores, pela escolaridade média — é um dos principais determinantes da produtividade. Assim, a persistente estagnação educacional brasileira compromete o desempenho dos trabalhadores e limita o avanço do país em direção a patamares mais altos de desenvolvimento.
Mas quem é classificado como analfabeto funcional?
Segundo o Inaf, o nível de analfabetismo funcional abrange tanto os analfabetos absolutos (3% da população) quanto aqueles com domínio apenas rudimentar da leitura e da matemática (22%). Em termos práticos, isso significa que quase um terço dos brasileiros enfrenta dificuldades para compreender textos simples e realizar operações matemáticas básicas (soma, subtração, multiplicação e divisão) — competências essenciais para o cotidiano e para o ambiente de trabalho contemporâneo, que exige cada vez mais capacidades analíticas frente às novas tecnologias.
Educação brasileira em perspectiva internacional
A defasagem educacional do Brasil é evidente quando comparada a países com estrutura econômica semelhante. De acordo com a análise Barro-Lee de 2020, o brasileiro médio tem cerca de 8 anos de escolaridade — o menor índice entre os países latino-americanos analisados. Em contraste, argentinos, chilenos e italianos ultrapassam os 10 anos, em média.
A qualidade do ensino também apresenta sinais de declínio. Entre 2018 e 2022, os desempenhos no exame PISA cresceram cerca de 3% na Argentina e no Chile, mas recuaram quase 1% no Brasil. Além disso, o investimento por aluno no Brasil, de US$ 3.668 por ano segue muito abaixo da média dos países da OCDE, e também comparado com Chile cerca de US$ 6.347 e US$ 13.799 na Itália.
O cenário se repete nos investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D). Em 2023, o Brasil destinou apenas 0,4% do PIB à área, enquanto a Argentina investiu 0,5% e a Itália, 1,3%.
Essa baixa escolaridade e pouco investimento compromete a produtividade nacional
A consequência direta da baixa escolaridade e da falta de investimento em educação é uma produtividade estagnada: resultados abaixo do esperado em qualidade e investimentos desacelerados dão pouca base de conhecimento para que o trabalhador brasileiro consiga alcançar uma produtividade capaz de concorrer com os demais países da OCDE.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o trabalhador brasileiro gera, em média, US$22 por hora, enquanto seus pares na Argentina e no Chile produzem aproximadamente US$33, e na Itália, US$74,4. Essa diferença — que chega a mais de US$50 por hora em relação ao padrão italiano — impacta diretamente a competitividade do Brasil no cenário internacional.
No mesmo intervalo em que o Inaf observou a estagnação do analfabetismo funcional (2018 a 2025), o PIB per capita brasileiro cresceu apenas 7,3%. Já Argentina, Chile e Itália apresentaram uma média de crescimento superior a 16% — mais que o dobro do desempenho brasileiro.
Educação deveria ser encarada como política econômica
O déficit educacional brasileiro não é apenas uma questão social – é um entrave decisivo ao aumento da produtividade e ao crescimento sustentado da economia. Investir 70% menos em educação básica do que países semelhantes resulta em déficits de aprendizado que comprometem o futuro econômico do país.
Superar o analfabetismo funcional deveria ser entendido como uma estratégia econômica urgente. Sem uma política educacional robusta, que amplie o acesso e eleve a qualidade do ensino, o Brasil continuará preso em ciclos de produtividade limitada e baixo crescimento econômico. A resposta para romper esse ciclo passa, inevitavelmente, pelo aprendizado.
*Rafaela Tavares Lima é Publicitária e Estudante de Economia do Ibmec Rio de Janeiro e Samuel de Jesus Monteiro de Barros é Reitor do Ibmec Rio de Janeiro, Doutor em Administração e especialista em Finanças.
Fonte: Exame